Como um autêntico filho de uma nova era que disputavelmente havia começado com Francis Bacon e suas ferozes críticas aos gregos (particularmente à Aristóteles), à ciência medieval e ao Escolasticismo, Spinoza buscou a certeza do novo método científico e da matemática. Impressionado por Galileu, ele ocupou-se sobremaneira com o uso da demonstração que caracteriza a técnica racionalista e, de certa forma, negligenciou o fator observação que distingue a forma empiricista de estudo.
Como seria de se esperar, nem todos os gênios intelectuais do tempo entenderam a certeza do novo método científico da mesma maneira. Hobbes, por exemplo, havia mantido que o novo método não trazia conhecimento real do mundo, pois que
Ninguém pode chegar a saber, através do discurso, que isto ou aquilo é, foi ou será, o que equivale a saber absolutamente. É possível apenas saber que, se isto é, aquilo também é; que, se isto foi, aquilo também foi; e que, se isto será, aquilo também será; o que equivale a conhecer condicionalmente. E não se trata de conhecer as conseqüências de uma coisa para outra, e sim as do nome de uma coisa para outro nome da mesma coisa. (Leviatã Capítulo VII, pg 40)
Em outras palavras, para Hobbes a nova ciência era apenas uma ciência das conseqüência dos nomes, e a certeza de sua demonstração terminava aí.
Já Descartes acreditava que havia uma ordem racional no mundo, ordem esta que a mente humana pode discernir em suas intuições claras e distintas. Para ele o conhecimento matemático é absoluto enquanto que para Hobbes é condicional.
Usando seu próprio método (o método cartesiano) Descartes buscou encontrar uma coisa da qual poderia ter certeza absoluta para então descobrir que outras certezas derivadas poderia encontrar. Ele acabou encontrando três; Cogito (ego), Deus e matéria. Mas que categoria de coisas são estas? Pareceu-lhe óbvio que tudo o que existe é ou uma substância, ou um atributo de uma substância. Ele definiu substância como "uma coisa que existe de tal maneira que não necessita de outra coisa para existir", logo as três coisas mencionadas tinham, necessariamente, que ser substâncias, não atributos.
Foi ao tentar "corrigir" e expandir as idéias de Descartes que Spinoza chegou à sua própria concepção de Deus.
A teoria da substância sustenta que uma coisa é composta de várias propriedades mais uma substância subjacente a qual essas propriedades pertencem (Georges Dicker), e é também algo que não depende de nehuma coisa exterior. Esta última característica assinala a grande diferença entre uma substância e um atributo. Um atributo não tem existência isolado da substância, da mesma forma que o cheiro não existe independentemente da flor, e a dureza não existe independentemente da pedra. Então, Spinoza pensou, por que Descartes e Tomás de Aquino chamam várias coisas de substância? Por que eles fazem distinção entre substância finita e substância infinita? Se por definição uma substância não pode depender de qualquer coisa que seja então as coisas que eles chamam de substâncias finitas não são substâncias coisíssima nenhuma. Se existe tal coisa chamada substância a única substância possível é Deus, pois Deus é a única coisa que não depende de coisa nenhuma para existir. O ego e a matéria não passam de atributos desta única substância. Caso existisse mais do que uma substância teria que existir mais do que um universo, e isto seria absurdo.
Estas reflexões o levaram a formular a
PROPOSIÇÃO VIII
Toda substância é necessariamente infinita
DEMONSTRAÇÃO - A substância de qualquer atributo não pode ser senão única (Prop. V), e é próprio de sua natureza que ela exista, quer como coisa finita, quer como coisa infinita. Mas, não como coisa finita, pois, neste caso (Definição II), deveria ser limitada por uma outra da mesma natureza, a qual (Prop. VII) deveria necessariamente existir; haveria, pois, duas substâncias do mesmo atributo, o que é absurdo (Prop. V). Ela existe pois, como infinita. (Ética, pg 19)
Spinoza estava empregando o método cartesiano mais consistentemente do que o próprio Descartes jamais havia feito. A Regra III do Regras para a Direção da Mente de Descartes estabelecia que
Nos assuntos que propomos investigar, nossas buscas devem ser direcionadas, não ao que outros pensaram, não ao que nós mesmos presumimos, mas ao que podemos notar clara e perspicuamente, e deduzir com certeza; pois o conhecimento não pode ser obtido de nenhuma outra forma... (Haldane and Ross, Works Vol. I, pg 5).
Spinoza também aplicou o método geométrico à metafísica. Para ele a realidade consiste em um grupo de entes implicatoriamente relacionados. W. T. Jones explica:
Como conseqüência, a mente move-se de uma entidade A para outra entidade B, que é implicada por A. Quando a mente está na presença destes duas entidades A e B, infalivelmente vê que A implica B. Ela então move-se para C, que é implicada por B, e assim em diante. O problema inteiro consiste em organizar nosso pensamento sobre estas entidades de tal forma que nossa mente atravesse estas relações em perfeita ordem, ou seja, que movamos de A para C, através de B. (A History of Western Philosophy - Hobbes to Hume, W.T. Jones, pg 194)
Isto Spinoza fez usando demonstrações, provas, corolários, e principalmente definições.
I. - Entendo por causa de si aquilo cuja essência implica existência; ou, por outra, aquilo cuja natureza não pode ser concebida senão como existente.
II. - Diz-se finita em seu gênero a coisa que pode ser limitada por uma outra da mesma natureza. Por exemplo, um corpo chama-se finito porque podemos sempre conceber um outro maior. Da mesma maneira, um corpo não é limitado por um pensamento, nem um pensamento por um corpo.
III. - Entendo por substância o que é em si e se concebe por si; isto é, aquilo cujo conceito não tem necessidade do conceito de outra coisa, do qual deva ser formado.
IV. - Entendo por atributo aquilo que o entendimento percebe de uma substância como constituindo a essência dela.
V. - Entendo por modo as afecções (affectiones) da substância, ou por outra, o que existe em outra coisa, mediante a qual também é concebido.
VI. - Entendo por Deus o ser absolutamente infinito isto é, uma substância constituída por uma inifindade de atributos, cada um dos quais exprime uma essência eterna e infinita (Ética, pg 15).
E como, por definição, não pode existir mais do que uma substância no mundo, chegamos à conclusão previsível da
PROPOSIÇÃO XV
Tudo o que existe, existe em Deus, e nada, sem Deus, pode existir nem ser concebido.
DEMONSTRAÇÃO - Afora Deus nenhuma substância pode existir e nem ser concebida (Prop .XIV), isto é (Def. 111), nenhuma coisa que é em si e é concebida por si. De outra parte, os modos (Definição V) não podem existir nem ser concebidos sem a substância; portanto só podem existir na natureza divina e ser concebidos por ela. Ora, nada existe fora das substâncias e dos modos (Axioma I). Portanto, nada, sem Deus, pode existir nem ser concebido. (Ética, pg 29)
Mas qual é a natureza deste Deus-substância compreendido por Spinoza?
O Deus da tradição judaico-cristã, mesmo com todos os atributos que Lhe são próprios, age e pensa como os homens. Ele pode ser um Pai amoroso que se preocupa com seus filhos, e ao mesmo tempo pode ser justo e imparcial. Ele é capaz de experimentar vários sentimentos, da satisfação à fúria, da sede de vingança à renúncia do perdão. Ao estudar a Bíblia aprendemos que Deus criou Adão e Eva, que se irritou quando foi desobedecido por eles, e os expulsou do paraíso. Sabemos que Ele comunicou-se com Moisés através de uma sarça ardente, apartou o mar, destruiu os muros de Jericó, enviou uma enchente para destruir uma civilização inteira de pecadores, protegeu alguns (como Davi), condenou outros (como as crianças de Sodoma e Gomorra), enviou Seu filho para morrer na cruz pelos pecadores, matou Safira e Ananias porque mentiram sobre as finanças do templo, e permitiu que milhares dos primeiros adoradores de Seu Filho sucumbissem nas mãos de torturadores e animais selvagens. E, mais importante do que tudo, sabemos que Ele reserva um lugar no céu para os que confiam nEle.
Este Deus antropomórfico é extremamente problemático e até parece sofrer de distúrbios psicológicos. A ira intensa e o ciúme exacerbado são contrabalançados com a mais profunda demonstração de amor e paciência. Suas características até faz-nos recordar aquelas outras divindades que residem no Olimpo.
O Deus de Spinoza não possui tais propriedades:
Há quem imagine que é Deus composto, como o homem, de corpo e alma, e sujeito às paixões; bastam as demonstrações precedentes para mostrar que aqueles estão afastados do verdadeiro conhecimento de Deus. Deixo-os de lado, pois os que, de qualquer modo, consideram a natureza divina, estão de acordo em negar que Deus seja corpóreo. E tiram estes muito justamente a prova desta verdade, do fato de entendermos por copo toda quantidade que seja longa, larga e profunda, limitada por uma certa figura; o que seria a coisa mais absurda que se possa dizer de Deus, ser absolutamente infinito. Ao mesmo tempo, porém, fazem ver claramente, tentando demonstrá-lo por outras razões, que separam inteiramente a substância corporal ou extensa, da natureza de Deus, e admitem que ela tenha sido criada por Deus. Mas ignoram completamente qual a potência divina que a pudesse criar,o que mostra claramente que não entendem o que eles próprio afirmam (Ibdem, pg 30)
E assim Spinoza destrói o Deus pessoal e bondoso da tradição judaico-cristã. Se as deduções de Spinoza estão corretas de nada adianta oferecer sacrifício, ir à missa todo domingo ou pedir socorro no momento mais necessário. Deus não é uma pessoa e não vai ouvir as súplicas. Ele também não vai ouvir os cantos de adoração. Para Ele o Messias de Haendel, o Requiem de Mozart e o Evangelho Segundo São Mateus, de Bach nada significam. E no entanto, Ele está naqueles hinos de louvor, assim como está em todas as coisas e em todas as partes. Ele é tudo o que existe, inclusive o mal que nos afeta. O Deus de Spinoza se aproxima perigosamente do panteísmo.
Mas ao mesmo tempo em que rouba do homem toda a proteção divina Spinoza nos eleva da condição miserável em que o apóstolo Paulo nos colocou.
As coisas particulares nada mais são do que afecções dos atributos de Deus, ou melhor, modos, pelos quais os atributos de Deus são expressos de maneira certa e determinada. Isso é demonstrado claramente pela Proposição XV e pela Def. V.
Assim, não somos os filhos que devem obediência e adoração cega ao pai, mas atributos de Deus. Somos parte dEle!
Algumas deduções de Spinoza têm sido objeto de crítica, especialmente a afirmação de que apenas uma substância pode existir no mundo. Tudo o que alguém precisa fazer, dizem, é provar que certas coisas são independentes entre si e a teoria de Spinoza irá por água abaixo. Talvez, mas é prazeiroso observar o mestre em ação, polindo conceitos, relacionando-os, deduzindo um dos outros com o rigor e dedicação de que apenas os grandes são capazes. E mesmo que algumas de suas conclusões estejam erradas o método que ele empregou (acrescentado à um pouco mais de observação empírica) é extremamente útil e desejável.
Como seria de se esperar, nem todos os gênios intelectuais do tempo entenderam a certeza do novo método científico da mesma maneira. Hobbes, por exemplo, havia mantido que o novo método não trazia conhecimento real do mundo, pois que
Ninguém pode chegar a saber, através do discurso, que isto ou aquilo é, foi ou será, o que equivale a saber absolutamente. É possível apenas saber que, se isto é, aquilo também é; que, se isto foi, aquilo também foi; e que, se isto será, aquilo também será; o que equivale a conhecer condicionalmente. E não se trata de conhecer as conseqüências de uma coisa para outra, e sim as do nome de uma coisa para outro nome da mesma coisa. (Leviatã Capítulo VII, pg 40)
Em outras palavras, para Hobbes a nova ciência era apenas uma ciência das conseqüência dos nomes, e a certeza de sua demonstração terminava aí.
Já Descartes acreditava que havia uma ordem racional no mundo, ordem esta que a mente humana pode discernir em suas intuições claras e distintas. Para ele o conhecimento matemático é absoluto enquanto que para Hobbes é condicional.
Usando seu próprio método (o método cartesiano) Descartes buscou encontrar uma coisa da qual poderia ter certeza absoluta para então descobrir que outras certezas derivadas poderia encontrar. Ele acabou encontrando três; Cogito (ego), Deus e matéria. Mas que categoria de coisas são estas? Pareceu-lhe óbvio que tudo o que existe é ou uma substância, ou um atributo de uma substância. Ele definiu substância como "uma coisa que existe de tal maneira que não necessita de outra coisa para existir", logo as três coisas mencionadas tinham, necessariamente, que ser substâncias, não atributos.
Foi ao tentar "corrigir" e expandir as idéias de Descartes que Spinoza chegou à sua própria concepção de Deus.
A teoria da substância sustenta que uma coisa é composta de várias propriedades mais uma substância subjacente a qual essas propriedades pertencem (Georges Dicker), e é também algo que não depende de nehuma coisa exterior. Esta última característica assinala a grande diferença entre uma substância e um atributo. Um atributo não tem existência isolado da substância, da mesma forma que o cheiro não existe independentemente da flor, e a dureza não existe independentemente da pedra. Então, Spinoza pensou, por que Descartes e Tomás de Aquino chamam várias coisas de substância? Por que eles fazem distinção entre substância finita e substância infinita? Se por definição uma substância não pode depender de qualquer coisa que seja então as coisas que eles chamam de substâncias finitas não são substâncias coisíssima nenhuma. Se existe tal coisa chamada substância a única substância possível é Deus, pois Deus é a única coisa que não depende de coisa nenhuma para existir. O ego e a matéria não passam de atributos desta única substância. Caso existisse mais do que uma substância teria que existir mais do que um universo, e isto seria absurdo.
Estas reflexões o levaram a formular a
PROPOSIÇÃO VIII
Toda substância é necessariamente infinita
DEMONSTRAÇÃO - A substância de qualquer atributo não pode ser senão única (Prop. V), e é próprio de sua natureza que ela exista, quer como coisa finita, quer como coisa infinita. Mas, não como coisa finita, pois, neste caso (Definição II), deveria ser limitada por uma outra da mesma natureza, a qual (Prop. VII) deveria necessariamente existir; haveria, pois, duas substâncias do mesmo atributo, o que é absurdo (Prop. V). Ela existe pois, como infinita. (Ética, pg 19)
Spinoza estava empregando o método cartesiano mais consistentemente do que o próprio Descartes jamais havia feito. A Regra III do Regras para a Direção da Mente de Descartes estabelecia que
Nos assuntos que propomos investigar, nossas buscas devem ser direcionadas, não ao que outros pensaram, não ao que nós mesmos presumimos, mas ao que podemos notar clara e perspicuamente, e deduzir com certeza; pois o conhecimento não pode ser obtido de nenhuma outra forma... (Haldane and Ross, Works Vol. I, pg 5).
Spinoza também aplicou o método geométrico à metafísica. Para ele a realidade consiste em um grupo de entes implicatoriamente relacionados. W. T. Jones explica:
Como conseqüência, a mente move-se de uma entidade A para outra entidade B, que é implicada por A. Quando a mente está na presença destes duas entidades A e B, infalivelmente vê que A implica B. Ela então move-se para C, que é implicada por B, e assim em diante. O problema inteiro consiste em organizar nosso pensamento sobre estas entidades de tal forma que nossa mente atravesse estas relações em perfeita ordem, ou seja, que movamos de A para C, através de B. (A History of Western Philosophy - Hobbes to Hume, W.T. Jones, pg 194)
Isto Spinoza fez usando demonstrações, provas, corolários, e principalmente definições.
I. - Entendo por causa de si aquilo cuja essência implica existência; ou, por outra, aquilo cuja natureza não pode ser concebida senão como existente.
II. - Diz-se finita em seu gênero a coisa que pode ser limitada por uma outra da mesma natureza. Por exemplo, um corpo chama-se finito porque podemos sempre conceber um outro maior. Da mesma maneira, um corpo não é limitado por um pensamento, nem um pensamento por um corpo.
III. - Entendo por substância o que é em si e se concebe por si; isto é, aquilo cujo conceito não tem necessidade do conceito de outra coisa, do qual deva ser formado.
IV. - Entendo por atributo aquilo que o entendimento percebe de uma substância como constituindo a essência dela.
V. - Entendo por modo as afecções (affectiones) da substância, ou por outra, o que existe em outra coisa, mediante a qual também é concebido.
VI. - Entendo por Deus o ser absolutamente infinito isto é, uma substância constituída por uma inifindade de atributos, cada um dos quais exprime uma essência eterna e infinita (Ética, pg 15).
E como, por definição, não pode existir mais do que uma substância no mundo, chegamos à conclusão previsível da
PROPOSIÇÃO XV
Tudo o que existe, existe em Deus, e nada, sem Deus, pode existir nem ser concebido.
DEMONSTRAÇÃO - Afora Deus nenhuma substância pode existir e nem ser concebida (Prop .XIV), isto é (Def. 111), nenhuma coisa que é em si e é concebida por si. De outra parte, os modos (Definição V) não podem existir nem ser concebidos sem a substância; portanto só podem existir na natureza divina e ser concebidos por ela. Ora, nada existe fora das substâncias e dos modos (Axioma I). Portanto, nada, sem Deus, pode existir nem ser concebido. (Ética, pg 29)
Mas qual é a natureza deste Deus-substância compreendido por Spinoza?
O Deus da tradição judaico-cristã, mesmo com todos os atributos que Lhe são próprios, age e pensa como os homens. Ele pode ser um Pai amoroso que se preocupa com seus filhos, e ao mesmo tempo pode ser justo e imparcial. Ele é capaz de experimentar vários sentimentos, da satisfação à fúria, da sede de vingança à renúncia do perdão. Ao estudar a Bíblia aprendemos que Deus criou Adão e Eva, que se irritou quando foi desobedecido por eles, e os expulsou do paraíso. Sabemos que Ele comunicou-se com Moisés através de uma sarça ardente, apartou o mar, destruiu os muros de Jericó, enviou uma enchente para destruir uma civilização inteira de pecadores, protegeu alguns (como Davi), condenou outros (como as crianças de Sodoma e Gomorra), enviou Seu filho para morrer na cruz pelos pecadores, matou Safira e Ananias porque mentiram sobre as finanças do templo, e permitiu que milhares dos primeiros adoradores de Seu Filho sucumbissem nas mãos de torturadores e animais selvagens. E, mais importante do que tudo, sabemos que Ele reserva um lugar no céu para os que confiam nEle.
Este Deus antropomórfico é extremamente problemático e até parece sofrer de distúrbios psicológicos. A ira intensa e o ciúme exacerbado são contrabalançados com a mais profunda demonstração de amor e paciência. Suas características até faz-nos recordar aquelas outras divindades que residem no Olimpo.
O Deus de Spinoza não possui tais propriedades:
Há quem imagine que é Deus composto, como o homem, de corpo e alma, e sujeito às paixões; bastam as demonstrações precedentes para mostrar que aqueles estão afastados do verdadeiro conhecimento de Deus. Deixo-os de lado, pois os que, de qualquer modo, consideram a natureza divina, estão de acordo em negar que Deus seja corpóreo. E tiram estes muito justamente a prova desta verdade, do fato de entendermos por copo toda quantidade que seja longa, larga e profunda, limitada por uma certa figura; o que seria a coisa mais absurda que se possa dizer de Deus, ser absolutamente infinito. Ao mesmo tempo, porém, fazem ver claramente, tentando demonstrá-lo por outras razões, que separam inteiramente a substância corporal ou extensa, da natureza de Deus, e admitem que ela tenha sido criada por Deus. Mas ignoram completamente qual a potência divina que a pudesse criar,o que mostra claramente que não entendem o que eles próprio afirmam (Ibdem, pg 30)
E assim Spinoza destrói o Deus pessoal e bondoso da tradição judaico-cristã. Se as deduções de Spinoza estão corretas de nada adianta oferecer sacrifício, ir à missa todo domingo ou pedir socorro no momento mais necessário. Deus não é uma pessoa e não vai ouvir as súplicas. Ele também não vai ouvir os cantos de adoração. Para Ele o Messias de Haendel, o Requiem de Mozart e o Evangelho Segundo São Mateus, de Bach nada significam. E no entanto, Ele está naqueles hinos de louvor, assim como está em todas as coisas e em todas as partes. Ele é tudo o que existe, inclusive o mal que nos afeta. O Deus de Spinoza se aproxima perigosamente do panteísmo.
Mas ao mesmo tempo em que rouba do homem toda a proteção divina Spinoza nos eleva da condição miserável em que o apóstolo Paulo nos colocou.
As coisas particulares nada mais são do que afecções dos atributos de Deus, ou melhor, modos, pelos quais os atributos de Deus são expressos de maneira certa e determinada. Isso é demonstrado claramente pela Proposição XV e pela Def. V.
Assim, não somos os filhos que devem obediência e adoração cega ao pai, mas atributos de Deus. Somos parte dEle!
Algumas deduções de Spinoza têm sido objeto de crítica, especialmente a afirmação de que apenas uma substância pode existir no mundo. Tudo o que alguém precisa fazer, dizem, é provar que certas coisas são independentes entre si e a teoria de Spinoza irá por água abaixo. Talvez, mas é prazeiroso observar o mestre em ação, polindo conceitos, relacionando-os, deduzindo um dos outros com o rigor e dedicação de que apenas os grandes são capazes. E mesmo que algumas de suas conclusões estejam erradas o método que ele empregou (acrescentado à um pouco mais de observação empírica) é extremamente útil e desejável.
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